Como as zonas de processamento de exportação redesenharam a economia dos Emirados Árabes

Como as zonas de processamento de exportação redesenharam a economia dos Emirados Árabes

Tempo de leitura: 6 minutos

| Camilla Beyersdorff Lucchiari | Em um mundo cada vez mais globalizado, o comércio internacional assume papel fundamental no crescimento econômico das nações. A capacidade de competir no mercado global tornou-se um fator decisivo para o desenvolvimento sustentável, exigindo que os países adotem políticas públicas voltadas à atração de investimentos, à geração de empregos e à integração com as cadeias produtivas globais. Nesse cenário, criar um ambiente favorável ao fluxo de bens, serviços, capitais e tecnologia não é apenas uma vantagem competitiva, mas uma necessidade estratégica para o progresso econômico.

Diante dessa realidade, muitos governos têm buscado desenvolver mecanismos que estimulem a presença de empresas estrangeiras em seus territórios, promovendo a modernização da indústria local e o aumento das exportações. Uma das ferramentas mais eficazes nesse contexto tem sido a criação das Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs), áreas com incentivos fiscais, regulatórios e logísticos especialmente voltados para o comércio exterior. Esses espaços oferecem condições atrativas para empresas que desejam produzir com maior eficiência e acessar novos mercados, funcionando como catalisadores do desenvolvimento industrial e tecnológico.

Nas ZPEs, as empresas podem importar matérias-primas, insumos e bens de capital com a utilização de tratamentos tributários diferenciados. Além disso, há a possibilidade de se recorrer a tratamentos administrativos e cambiais mais benéficos.

Estas áreas também funcionam como polos de desenvolvimento regional, promovendo o crescimento de cadeias produtivas e a geração de empregos. Elas têm, portanto, múltiplos objetivos: fomentar a industrialização, impulsionar a competitividade internacional, atrair investimentos e promover o desenvolvimento tecnológico.

Não obstante, é importante observar que a efetividade destas zonas depende da sua integração com o restante da economia nacional, da qualidade da infraestrutura oferecida e do grau de estabilidade institucional e jurídica. Zonas mal planejadas ou desconectadas das políticas nacionais de desenvolvimento tendem a gerar efeitos limitados e, por vezes, distorções econômicas.

Até poucas décadas atrás, a economia dos Emirados Árabes Unidos era fortemente dependente das receitas oriundas da exploração de petróleo, principal motor do desenvolvimento nacional desde a sua fundação. No entanto, reconhecendo a necessidade de diversificação econômica e sustentabilidade a longo prazo, o país implementou uma série de políticas estratégicas voltadas para a atração de investimentos estrangeiros. Essas iniciativas incluíram a criação de zonas econômicas especiais, incentivos fiscais e melhorias na infraestrutura, consolidando os Emirados como um importante centro global de negócios, turismo e inovação.

Especialização temática

As ZPEs começaram a ser implementadas nos emirados a partir da década de 1980, com a criação da Jebel Ali Free Zone (Jafza), tendo o objetivo de criar um polo logístico e industrial que conectasse o país a outros mercados [1]. Desde então, os Emirados Árabes Unidos investiram na criação de dezenas de zonas econômicas especiais em seus emirados, cada uma com perfil setorial e regulatório próprio.

Entre os principais benefícios oferecidos aos investidores estão: 100% de propriedade estrangeira, o que dispensa a exigência de sócio local; isenção total de impostos corporativos por períodos renováveis de até 50 anos; isenção de tarifas alfandegárias; facilidade de repatriação de lucros e capitais; e processos simplificados de licenciamento e registro empresarial [2].

Um aspecto importante do modelo dos emirados é a especialização temática das zonas. Por exemplo, a Dubai Internet City é voltada a empresas de tecnologia e comunicação; a Dubai Healthcare City, ao setor de saúde; a Dubai International Financial Centre (DIFC), aos serviços financeiros; e a já mencionada Jafza, ao setor industrial e logístico. Essa segmentação permite atender de forma mais eficaz às necessidades dos diferentes setores produtivos e criar ecossistemas de inovação e cooperação empresarial.

Além de Dubai, outros emirados como Abu Dhabi, Sharjah, Ras Al Khaimah e Fujairah também investiram em ZPEs com características semelhantes. Em Abu Dhabi, por exemplo, destaca-se a Khalifa Industrial Zone Abu Dhabi (Kizad), que é conectada ao Porto de Khalifa e possui ênfase em manufatura pesada, energia e logística. A multiplicidade dessas zonas contribuiu para o aumento da atratividade dos Emirados Árabes Unidos como destino global de investimentos estrangeiros diretos.

O impacto das ZPEs na economia dos Emirados Árabes Unidos é significativo. Segundo dados do Ministério da Economia do país, estas zonas são responsáveis por uma parcela expressiva do Produto Interno Bruto e respondem por cerca de 30% das exportações nacionais [3]. Além disso, abrigam milhares de empresas estrangeiras e geram empregos diretos e indiretos em diferentes setores da economia.

As ZPEs também têm contribuído para a transferência de tecnologia e o fortalecimento da capacidade de inovação nacional, uma vez que muitas empresas de base tecnológica se instalam nessas áreas com o objetivo de acessar mercados regionais e desenvolver produtos e serviços competitivos. Por sua vez, os Emirados Árabes Unidos oferecem programas de incentivo à pesquisa e desenvolvimento e aceleradoras de startups dentro das próprias zonas.

Do ponto de vista estratégico, as ZPEs funcionam como um instrumento central da política de diversificação econômica, especialmente em um país que historicamente dependeu das receitas provenientes do petróleo. As zonas permitiram aos Emirados Árabes Unidos desenvolver setores alternativos como serviços financeiros, comércio eletrônico, turismo médico, logística e manufatura de alto valor agregado.

O exemplo dos Emirados Árabes Unidos evidencia de forma clara como a criação de institutos voltados à atração de investimentos estrangeiros pode ser determinante para o fortalecimento da economia de um país. Ao investir estrategicamente em ZPEs, o Estado não apenas impulsionou suas exportações e gerou empregos, como também promoveu inovação, diversificação produtiva e aumento da competitividade internacional. Essa experiência reforça a necessidade de que outros países adotem políticas semelhantes, com ambientes regulatórios e institucionais favoráveis, capazes de atrair capital externo, fomentar o desenvolvimento tecnológico e impulsionar o crescimento econômico sustentável.

[1] Disponível aqui>

[2] Disponível em: < https://www.moet.gov.ae/en/free-zones?p_l_back_url=%2Fen%2Fsearch-results%3Fq%3Dfree%2520zone>

[3] Disponível em: < https://www.gov.br/empresas-e-negocios/pt-br/invest-export-brasil/exportar/conheca-os-mercados/como_exportar_privado/como-exportar.pdf/copy_of_GuiaComoExportarEAUPort.finalNov.2023.pdf#:~:text=De%20acordo%20com%20os%20n%C3%BAmeros%20de%202018,sua%20Lei%20das%20Sociedades%20Comerciais%2C%20permitindo%20agora.>

Camilla Beyersdorff Lucchiari

é advogada no escritório Medeiros Emerick Advogados, especialista em Direito Aduaneiro e Comércio Exterior, graduada em Direito pelo Centro Universitário Curitiba (Unicuritiba), pós-graduada em Direito Aduaneiro pelo Unicuritiba, pós-graduada em Direito Internacional pela Ebradi, pós-graduada em Direito Constitucional pela Estácio Cers, secretária adjunta da Comissão de Direito Marítimo, Portuário e Aduaneiro da OAB-PR.

Fonte: Consultor Jurídico | Foto: Reprodução

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