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| Adilson Luiz Gonçalves | Uma matéria jornalística de 31/08/2025 tem como título: “Após 37 anos, zonas de processamento de exportações têm resultados irrelevantes no Brasil, aponta auditoria da CGU”.
Creio que, como eu, quem leu esse título imaginou que a matéria seria depreciativa do regime de ZPE, e a leitura dos primeiros parágrafos reforça essa percepção.
O mencionado relatório da CGU, publicado em 27/08/2025, conclui que os efeitos da criação de ZPEs foram “limitados e incipientes”, e que apenas a de Pecém/CE alcançou resultados significativos, “com aumento da produção industrial e aumento do salário médio dos trabalhadores”.
A CGU considerou não ter havido “tempo suficiente para observar impactos significativos” das ZPEs no comércio exterior brasileiro. Também pontuou que o Conselho Nacional de Zonas de Processamento de Exportação (CZPE) não teria dados atualizados do volume de exportações de Pecém.
Isso é, no mínimo, surpreendente, na medida em que o MDIC, ao qual o CZPE está vinculado, possui, em tese, esse tipo de controle, que também poderia ser verificado junto à ANTAQ, salvo engano.
Muitas coisas estão “no ar”, bastante claras para várias pessoas. No entanto, quem as sintetiza e divulga normalmente assume protagonismo, como foi o caso de William Deming, ao definir que “o que não se mede, não se gerencia”.
Os aspectos não muito promissores continuam quando a CGU alega que, segundo a Secretaria Especial da Receita Federal, as empresas que operam nas ZPEs de Pecém/CE e Parnaíba/PI somaram mais de R$ 700 milhões de renúncia fiscal de 2023 a setembro de 2024. Também destaca que a ZPE de Pecém/CE importou, em 2018, US$ 1,48 bilhão.
Porém, o subtítulo destacado é: “Novos projetos devem gerar R$ 26 bilhões em exportações”, associados a “48 novos projetos industriais, formalizados a partir de 2021, somando 69 projetos até setembro de 2024”, dos quais 11 foram aprovados nos 12 meses anteriores à publicação do relatório da CGU.
Os números então expressos são bastante interessantes, entre investimentos, exportações e geração de cerca de 5,5 mil empregos diretos e indiretos.
O regime de ZPE foi criado em 1988, mas pouco evoluiu no Brasil. Modelos similares, como as Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), têm sido muito bem-sucedidos internacionalmente, tanto em países democráticos como nos que adotam regimes de partido único, sendo a China o caso mais emblemático.
Por aqui, a caducidade de autorizações para a implantação de ZPEs chama a atenção, e as próprias restrições do regime, anteriores a 2021, que restringiam sua criação a áreas menos desenvolvidas, com maior ênfase nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, não pareciam ajudar muito.
Ainda segundo a matéria, embora 12 ZPEs estejam com decreto de criação vigente, somente as de Pecém/CE, Parnaíba/PI, Cáceres/MT e Uberaba/MG estão ativas, com uma diferença de cerca de 10 anos entre a primeira e as demais.
Uberaba é a única municipal, sendo as demais criadas por seus respectivos estados.
Uma novidade, a partir da revisão de 2021, foi a autorização para a criação de ZPEs privadas, sendo a de Aracruz/ES a primeira a ser autorizada. Ela faz parte das 23 novas propostas de ZPEs, incluindo as de Bacabeira/MA e Bataguassu/MS.
As ZPEs devem ser idealmente criadas próximas a portos, aeroportos e fronteiras, e têm o desenvolvimento tecnológico como uma de suas metas, o que está em perfeita sintonia com a proposta de neoindustrialização do Brasil.
Assim como ocorreu em outros países em que o regime de ZEEs tem apresentado bons resultados, iniciativas de PD&I estão diretamente associadas, agregando valor à produção e competitividade nas exportações.
No entanto, sua implantação próxima a portos, como a própria expansão das atividades portuárias e retroportuárias, sofre com os rigores da legislação ambiental. Os benefícios socioeconômicos e as medidas mitigadoras e compensatórias nem sempre são suficientes para obter os licenciamentos ambientais. Às vezes elas inviabilizam os empreendimentos.
Pelo sistema portuário nacional circula cerca de 95% da balança comercial do Brasil, sendo, portanto, um elo fundamental da cadeia logística.
Mas ainda somos majoritariamente exportadores de “commodities” de baixo valor agregado, que também sofrem resistências internas, que ignoram a importância do agronegócio para a economia nacional, e externas, em função de protecionismos.
A produção industrial nacional precisa ter maior protagonismo no mercado interno e externo, inclusive como fator de soberania, em vários setores em que somos dependentes de tecnologias importadas, além da pouco representativa produção de patentes de interesse comercial.
O regime de ZPE precisa de novos aprimoramentos para fomentar novos e efetivos empreendimentos?
Creio não haver dúvida de que sim.
O PNL 2050 pode ser extremamente útil no planejamento estratégico de sua implantação, favorecendo regiões menos desenvolvidas, mas também incentivando as que já apresentam melhores condições. Em suma, acelerar e dinamizar, sem a retórica anacrônica e pouco produtiva do “freio de arrumação”.
Ao que consta, a Reforma Tributária não prejudicará o regime de ZPE, e a legislação vigente já inibe a concorrência desigual com as indústrias existentes no Brasil. A produção destinada à exportação gozará dos benefícios previstos para indústrias e prestadores de serviços nas ZPEs, mas o que for comercializado no mercado interno estará sujeito às mesmas condições das indústrias fora delas.
Produzir e gerar empregos, em qualquer circunstância, tende a apresentar resultados socioeconômicos positivos, reduzindo a demanda por programas sociais, permitindo até a redução de impostos, ao menos em tese.
Porém, além de revisar o regime de ZPE e incluir sua prospecção no planejamento estratégico do país, é igualmente melhor divulgá-lo.
O Secretário-Executivo do CZPE, Fábio Pucci, participou da sessão da Comissão de Viação e Transportes da Câmara dos Deputados, realizada em 16/09/2025, que tinha como tema a instalação de portos secos e de Centros Logísticos Industriais Aduaneiros (CLIAs).
Em pesquisa sobre CLIA, encontrei duas Medidas Provisórias que não foram convertidas em lei, uma Portaria da Receita Federal e um Parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Smj, apesar da inclusão da palavra “industrial” na denominação, não encontrei menção à produção industrial num CLIA, o que é claramente definido no regime de ZPE.
Quando foi dada a palavra a Fábio Pucci, ele informou que, além dos cerca de 27 portos secos e 32 CLIAs, também existem 4 ZPEs.
Em seguida, disse que faria uma boa provocação, por meio de uma apresentação sobre o regime de ZPE, introduzida com a pergunta: “O que é uma ZPE?”
Um dos deputados presentes exclamou ser mais uma sigla, demonstrando desconhecimento sobre o assunto, apesar do regime de ZPEs existir desde 1988, muito antes dos portos secos (1990) e CLIAs (2006), e da coordenação da audiência estar a cargo do Deputado Leônicas Cristino, do Ceará.
É verdade que o regime de “drawback” é anterior ao de ZPE, embora guarde alguma similaridade. A diferença é que uma ZPE é uma área geográfica física, nesse sentido, tal como os portos secos e CLIAs. A diferença é que a produção industrial em sua área pode ser destinada a exportações e ao mercado interno.
Apenas por isso, o tema do evento já deveria incluir ZPE na pauta dessa Comissão Parlamentar. Mas também demonstra a necessidade de divulgar de forma mais objetiva o regime de ZPE, além de obter amplas contribuições para sua melhoria.
O Brasil precisa de mais ZPEs, de mais investimentos em PD&I e de melhor qualidade na educação básica e profissional para assegurar o efetivo desenvolvimento sustentado do país e a melhoria contínua da qualidade de vida de sua população.
Fonte: Jornal Portuário | Foto: Reprodução
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