Governo e indústria discutem reformulação das ZPEs em MP

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Integrantes do governo, representantes da indústria nacional e defensores da ampliação das zonas de processamento de exportação (ZPEs) aproveitaram uma medida provisória (MP) editada para viabilizar o abastecimento de oxigênio durante a pandemia para reformular a lei que rege o funcionamento dessas áreas. O texto acordado retira travas existentes para vendas ao mercado interno e impõe outras para evitar “concorrência desleal”. 

ZPEs são áreas de livre-comércio com o exterior, com tratamento tributário, cambial e administrativo diferenciado. As empresas instaladas nelas adquirem bens e serviços do mercado interno sem pagarem tributos e são dispensadas de várias licenças para funcionamento, mas, em contrapartida, precisam destinar 80% de sua produção para o exterior ou são punidas. Os benefícios são válidos por 20 anos da data de instalação. 

Apesar de previstas em lei há 30 anos, as ZPEs não vingaram. Já existiram 26 áreas habilitadas para operar, mas atualmente são apenas 14 – as outras foram descredenciadas porque não fizeram os investimentos no prazo. Hoje, a única a funcionar fica em São Gonçalo do Amarante (CE), formada em torno da Companhia Siderúrgica do Pecém. 

Foi justamente por causa dessa ZPE que o governo Bolsonaro editou uma MP para acabar com a cota de exportação durante o ano de 2020. Na região opera uma empresa que produz oxigênio de uso medicinal, que foi revertido para o mercado interno por causa da covid-19. O relator da MP, o deputado Júlio César (PSD-PI), aproveitou o texto para acelerar a reformulação da lei das ZPEs, que está em discussão no Congresso desde 2012. 

O parecer permite que empresas de serviços “exportáveis” sejam beneficiadas pelo modelo (hoje só indústrias são autorizadas) e amplia a suspensão de tributos de importação para itens não primários, como insumos para a agroindústria e peças. Entes privados poderão propor ao governo a criação da ZPE e a área não precisará mais ser contínua. 

O texto também acaba com a cota de exportação de 80%, permitindo que toda a produção seja destinada para o mercado interno. Mas as empresas nas ZPEs terão que pagar o Imposto de Importação, o Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) e também uma multa de 0,03% ao dia pelas vendas para o Brasil, para evitar “concorrência desfavorável”. As exportações continuarão isentas. 

O presidente da Associação Brasileira das Zonas de Processamento de Exportação (ABRAZPE), Helson Braga, afirmou que era a favor de ampliar a cota do mercado interno de 20% para 40% e que tem “sólidos argumentos” contra a multa, mas que aceitou o novo formato pelo acordo. “Cedemos os anéis para não perdermos os dedos. Mas há uma emenda que amplia a base de tributos sobre a qual será aplicada a multa e com isso não concordamos”, disse. A entidade defende que seja aprovado, na íntegra, o parecer do relator. 

A equipe econômica do governo tem apoiado a discussão e emitiu parecer interno a favor das principais mudanças. Em nota, o Ministério da Economia disse que se posicionou a favor de uma das emendas acolhidas pelo relator, mas não analisou o parecer completo. O ministro Paulo Guedes não participou das negociações, mas já defendeu em entrevistas que o modelo das ZPEs foi essencial para o crescimento da China e que pretendia estimulá-lo no país. 

Para Helson Braga, a única forma de criar esse estímulo é uma mudança consistente na lei. “Ou continuaremos a brincar de ZPE por mais 30 anos sem que nenhuma saia do papel”, disse. 

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou em nota que a MP é essencial por causa da covid-19 e que, numa “análise preliminar do parecer”, converge com as mudanças do texto. “Destacamos, entretanto, que a confederação ainda não completou a análise técnica de todos os efeitos da nova proposta.” 

Para o deputado Júlio César, o parecer está bastante negociado e é “quase consenso”. “Tem Estado que é contra a ampliação das ZPEs, como São Paulo, mas diminuímos muito as resistências”, disse ele. A expectativa é de aprová-lo na próxima semana no plenário da Câmara. O texto precisa do aval do Congresso até o dia 24.

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